iCHSTM 2013 Programme • Version 5.3.6, 27 July 2013 • ONLINE (includes late changes)
Index
| Paper sessions timetable | Lunch and evening timetable | Main site
Arquivos de ciência, crime e loucura: “irresponsabilidade penal” e “periculosidade” no debate médico-jurídico brasileiro da década de 1930
Archives of science, crime and insanity: ‘criminal irresponsibility’ and ‘dangerousness’ in the medical-legal debate in 1930s Brazil
Allister Dias | Fundação Oswaldo Cruz, Brazil

As discussões sobre a natureza do homem criminoso no Brasil começam a se adensar de forma mais significativa em fins do século XIX e início do século XX, com a tomada de posições de médicos e juristas perante os debates internacionais vigentes no período, e, sobretudo, em deliberações sobre casos concretos nos quais a questão da possível anormalidade de delinquentes foi colocada, implicando a ingerência do saber médico-antropológico no âmbito da justiça penal.

Esta apresentação abordará dois temas centrais no debate médico-jurídico no Brasil deste contexto, como ênfase na década de 1930: a “periculosidade” e a “irresponsabilidade penal” de certos criminosos. Os debates sobre estes temas serão acompanhados em três relevantes espaços de discussões criminológicas do período: o Conselho Penitenciário do Rio de Janeiro, o Manicômio Judiciário do Rio de Janeiro e a Sociedade Brasileira de Criminologia. Em tais instituições são debatidos os destinos legais e institucionais de vários criminosos, bem como suas naturezas antropológicas e morais. Configuram-se, assim, discursos e posições muito claras por parte de médicos e juristas do período. A dicotomia estrita médico-jurista não faz sentido aqui, na medida em que ora psiquiatras discordam entre si, ora psiquiatras e juristas concordam e se aliam na defesa de certos argumentos, ora juristas se opõem, entre outras configurações possíveis.

No que diz respeito à questão da irresponsabilidade penal, vários médicos e juristas passavam a defender a perspectiva da “responsabilidade atenuada” em casos de crimes por motivos passionais (a maioria com subsequente tentativa de suicídio), por paroxismo epilético ou mesmo em virtude da carga hereditária degenerada, reveladas em constituições psíquicas e orgânicas anômalas, de certos criminosos. A possibilidade de um individuo ser “parcialmente responsável” por seus atos não estava prevista na legislação penal brasileira do período, e era componente essencial em certos discursos. Nesse âmbito, algumas perspectivas psiquiátrico-antropológicas eram questionadas por focar unicamente fatores individuais, desconsiderando os interesses coletivos. Já a questão da periculosidade constituía-se num grande denominador comum, orientando decisões judiciais. No entanto, era motivo de polêmica quando se atrelava a outras discussões, como a questão da regeneração dos delinquentes e a eficácia terapêutica do sistema prisional.

The discussions about the nature of the criminal man in Brazil begin to thicken more significantly in the late nineteenth and early twentieth century, with the positions taken by doctors and lawyers about the current international debates in the period, and especially in deliberations on specific cases in which the issue of the possible abnormality of offenders was placed, implying the interference of the medical-anthropological knowledge within the criminal justice.

This presentation will address two central issues in the medico-legal debate in Brazil, emphasising the 1930s: the "dangerousness" and the "criminal irresponsibility" of certain criminals. The discussions about these topics will be analyzed in three relevant areas of criminological discussions of the period: the Penitentiary Council of Rio de Janeiro, the Forensic Hospital of Rio de Janeiro and the Brazilian Society of Criminology. In such institutions are discussed the legal and institutional destinations of various criminals and their anthropological and moral natures. Then, the speeches and positions of the physicians and jurists of the period became very clear. The strict dichotomy between doctors and lawyers does not make sense here, since psychiatrists sometimes disagreed, while in some situations psychiatrists and jurists agreed and got together in defense of certain arguments, among other settings.

Regarding the issue of criminal irresponsibility, several doctors and lawyers began defending the prospect of "attenuated responsibility" in cases of crime of passion (most with subsequent attempted of suicide), epileptic paroxysm or even due to degenerated heredity, revealed by anomalous organic and psychic constitution of certain criminals. The possibility of an individual being "partly responsible" for his actions was not foreseen in the Brazilian penal legislation of the period, and was an essential component in certain opinions. In this context, some psychiatric-anthropological perspectives were questioned for focusing only individual factors, disregarding collective interests. Nevertheless, the issue of “dangerousness” was a great common denominator, guiding judgments. However, it was a source of controversy when it had to deal with other discussions, such as the issue of regeneration of offenders and therapeutic efficacy of the prison system.